Em Decisão Monocrática, o Ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Felix Fischer, decidiu suspender, pela segunda vez, as eleições suplementares em Sena Madureira, marcadas para o dia 06 de dezembro.
A decisão atende a uma ação cautelar (nº3362) interposta pelo prefeito Nilson Areal, eleito em 2008 e que foi cassado duas vezes pelo Tribunal Regional Eleitoral do Acre (TRE-AC). No recurso, o prefeito cassado pede ao TSE que seja deferida liminar visando a suspensão do novo pleito eleitoral em Sena Madureira.
Em ação de investigação judicial eleitoral (n. 355) movida pela Coligação Por Uma Sena Melhor, Nilson Areal e o vice, Jairo Cassiano, foram acusados de se beneficiarem de um cheque no valor de R$ 1.500, emitido pela Câmara de Vereadores do município e que teria o objetivo de pagar o aluguel de um prédio onde funcionaria o comitê eleitoral da coligação que os apoiava. O julgamento desse processo pelo TRE, ocorrido no dia 06 de outubro, resultou na segunda cassação do prefeito de Sena.
Em sua decisão, comunicada ao TRE no início da noite desta segunda-feira (09), o Ministro Félix Fischer afirma que, “em exame perfunctório, não vislumbro a explícita finalidade eleitoral de tais cheques, tampouco a potencialidade lesiva neste caso”. Fischer diz ainda que o documento (cheque) “era desprovido das formalidades previstas no Regimento Interno da Câmara de Vereadores, pelo que não teria serventia. Some-se a isso, o fato de o cheque não ter sido utilizado, pois foi sustado”. O ministro conclui enfatizando que “há fundadas dúvidas quanto à configuração do ilícito eleitoral”.
Embora a liminar tenha sido deferida pelo TSE, o cargo de prefeito de Sena Madureira continuará sendo ocupado pelo presidente da Camâra de Vereadores, Wanderley Zaire (PP), até o julgamento do recurso especial interposto pelo prefeito cassado.
Leia a decisão do Ministro Félix Fischer na íntegra:
Decisão Monocrática em 09/11/2009 - Ação Cautelar Nº 3362 MINISTRO FELIX FISCHER
Vistos etc.
Trata-se de ação cautelar, com pedido de liminar, proposta por Nilson Roberto Areal de Almeida, visando atribuir efeito suspensivo a recursos especiais eleitorais interpostos contra v. acórdão proferido pelo e. Tribunal Regional Eleitoral do Acre e integrado pelo v. acórdão que julgou os declaratórios.
Referido decisum reformou a sentença de primeira instância e determinou a cassação do diploma de prefeito do recorrido, ao fundamento de que houve abuso do poder econômico (art. 14, § 10, da Constituição). Determinou-se, ainda, a realização de novas eleições, conforme se depreende do documento de fls. 183-197.
As decisões colegiadas ficaram assim ementadas (fls. 73 e 117):
RECURSO ELEITORAL - AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO - ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO - AGENTE PÚBLICO PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL E INTEGRANTE DE CHAPA MAJORITÁRIA - EMISSÃO DE CHEQUE DA CÂMARA MUNICIPAL - PAGAMENTO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL PARA FINS ELEITORAIS - CASSAÇÃO DO MANDATO - RECURSO PROVIDO.
Em sede de ação de impugnação de mandato eletivo, impõe-se a cassação do mandato do agente que integrou chapa majoritária e comprovadamente utilizou-se do cargo de Presidente da Câmara Municipal e de verba do mesmo órgão, em benefício próprio e de terceiro, mediante conduta que teve a potencialidade de influir no equilíbrio da disputa, pelas inegáveis vantagens advindas da disponibilidade de um prédio para a sua campanha eleitoral e da emissão de cheques em prol da mesma candidatura, estendendo-se a cassação ao beneficiário do ato, que integrou a mesma chapa.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - QUESTÕES NÃO SUSCITADAS EM RECURSO ELEITORAL - REDISCUSSÃO DA MATÉRIA - INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO - REJEIÇÃO.
Rejeitam-se os embargos de declaração que visam, ora suscitar questões novas, caracterizando verdadeira intenção de aditamento do recurso eleitoral, ora rediscutir os fundamentos da decisão embargada, com deduções que destoam da realidade dos autos.
O requerente narra os seguintes fatos:
a) os ora réus ajuizaram ação de impugnação de mandato eletivo em desfavor do autor, candidato a prefeito, e do candidato a vice-prefeito em Sena Madureira/AC “pela suposta utilização em seu benefício de cheques da Câmara Municipal de Sena Madureira e que referidos valores¿ foram empregados na campanha eleitoral, o que também, segundo a inicial, caracterizaria abuso de poder econômico” (fl. 3);
b) o juízo de primeira instância julgou improcedente a ação, por ausência de provas;
c) houve recurso ao e. TRE/AC, que reformou a sentença e cassou os diplomas do ora autor, prefeito eleito de Sena Madureira/AC, e do vice-prefeito eleito;
d) sobrevieram embargos de declaração, que foram rejeitados;
e) foram, então, interpostos recursos especiais eleitorais, que foram admitidos na origem.
Ato contínuo, afirma que os recursos especiais interpostos a preenchem todos os requisitos de admissibilidade e não pretende revolver os fatos e provas constantes dos autos, “tanto assim que o Presidente do TRE/AC ao admitir os Recursos expressamente se manifesta no sentido de que: o inconformismo dos recorrentes não se cinge à matéria fática, mas tão-somente à matéria de direito¿.” (fl. 5).
Em síntese, justifica a existência do fumus boni iuris pelos seguintes argumentos:
a) inverteu-se o ônus da provas no que se refere à alegação de que cheques da Câmara Municipal foram utilizados para fins eleitorais, violando-se o art. 302, I e III, do Código de Processo Civil. Isso porque, segundo afirma, atribuiu-se “aos Réus, a obrigação de provar que os cheques não foram utilizados em sua campanha” (fl. 8);
b) da moldura fática delineada no v. acórdão regional extrai-se que: “(i) o valor do aluguel era de R$ 300,00; (ii) referido aluguel foi pago efetivamente com recursos financeiros do candidato a Vereador Wanderley Zaire e (iii) os cheuques da Câmara Municipal foram sustados. No caso, portanto, não houve abuso de poder político ou econômico, podendo a conduta se situar - quando muito - no campo da tentativa, o que de logo se afasta a caracterização do abuso” (fl. 13);
c) não ficou comprovada a potencialidade, requisito indispensável para a configuração do abuso, porquanto ainda que se admitisse que os cheques da Câmara Municipal tivessem contribuído para o pagamento de aluguel de imóvel para campanha eleitoral, “essa seria a única irregularidade apontada na inicial, decorrente de pagamento de aluguel no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) ou de R$ 300,00 (trezentos reais)” (fl. 14), o que denotaria valor “absolutamente insignificante diante de uma eleição municipal para cargo majoritário” (fl. 15).
Aponta, ainda, a ilegitimidade ativa da Coligação recorrida, a inadequação da via eleita e a violação ao art. 275 do Código Eleitoral.
O periculum in mora se faria presente pelo fato de que as novas eleições foram marcadas para próximo dia 6 de dezembro de 2009. Anota, o autor, que se encontra afastado do exercício do mandato eletivo em razão da procedência de ação de investigação judicial eleitoral.
Ao fim, requerem a concessão de liminar para emprestar efeito suspensivo aos apelos especiais interpostos contra o v. acórdão regional, integrado pelo v. aresto que julgou os declaratórios, a fim de que sejam suspensas as novas eleições majoritárias em Sena Madureira/AC.
É o relatório. Decido.
No caso específico de ação cautelar ajuizada com o propósito de atribuição de efeito suspensivo a recurso especial eleitoral, nestes casos, pela excepcionalidade, os requisitos para a concessão da tutela cautelar têm de ser perceptíveis de plano, “não sendo de se exigir, do julgador, uma aprofundada incursão no mérito do pedido ou na dissecação dos fatos que lhe dão suporte, sob pena de antecipação do próprio conteúdo da decisão definitiva” (Min. Carlos Ayres Britto, MS nº 26415).
A partir da moldura fática delineada pelo v. acórdão regional, conclui-se que o autor, então réu nos autos da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, teve seu diploma cassado em razão de o vice-prefeito que compunha a chapa majoritária ter-se utilizado de cheques da Câmara Municipal “em benefício da campanha eleitoral dos integrantes da chapa majoritária” (fl. 85).
Tal benefício estaria consubstanciado na emissão de cheques da Câmara Municipal pelo então vereador e candidato a vice-prefeito Jairo Cassiano.
Um desses cheques, no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) teria sido utilizado como “garantia” (fl. 82) de um contrato de locação de imóvel destinado ao funcionamento de comitê eleitoral.
Com relação a outros quatro cheques citados pelo autor da AIME (762688, 762689, 762718 e 762619), extrai-se do v. acórdão regional o seguinte:
Também releva notar que nos autos da AIME o representante indicou expressamente os números dos citados cheques e afirmou terem sido utilizados com a mesma finalidade do cheque de fl. 10. Tal afirmação não foi contestada por Jairo Cassiano, que, no ponto em destaque limitou-se a dizer que os cheques citados não estavam em julgamento, porquanto “esta demanda não é de investigação judicial e sim de impugnação, onde, necessariamente, as provas devem ser pré-constituídas” (fl. 31). Assim, comprovada a emissão irregular de cheques a que se referem os canhotos de fls. 87/88, e diante da omissão de Jairo Cassiano em demonstrar que não foram utilizados em benefício de sua campanha eleitoral, tenho que eles, tal como o cheque de fl. 12, tiveram a destinação indicada na petição inicial. (fl. 85).
Segundo o e. Tribunal a quo, isso denotaria a ocorrência de abuso de poder político e econômico.
Em primeiro lugar, cumpre salientar que esta c. Corte entende que o abuso de poder político, se “consistir em conduta configuradora de abuso de poder econômico”, pode ser objeto de ação de impugnação de mandato eletivo. Nesse sentido:
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. § 10 DO ARTIGO 14 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL: CAUSAS ENSEJADORAS.
1. O abuso de poder exclusivamente político não dá ensejo ao ajuizamento da ação de impugnação de mandato eletivo (§ 10 do artigo 14 da Constituição Federal).
2. Se o abuso de poder político consistir em conduta configuradora de abuso de poder econômico ou corrupção (entendida essa no sentido coloquial e não tecnicamente penal), é possível o manejo da ação de impugnação de mandato eletivo.
3. Há abuso de poder econômico ou corrupção na utilização de empresa concessionária de serviço público para o transporte de eleitores, a título gratuito, em benefício de determinada campanha eleitoral.
Recurso desprovido. (REspe nº 28.040/BA, Rel. Min. Carlos Ayres Britto, DJ de 1º.7.2008).
Não obstante a isso, penso que, em ligeira análise, as alegações do autor são plausíveis, uma vez que, com relação aos cheques de nos 762688, 762689, 762718 e 762619, a e. Corte de origem parece, de fato, ter invertido o ônus da prova relativa à finalidade eleitoral da emissão de tais cheques, o que se nota da seguinte passagem: “(…) comprovada a emissão irregular de cheques a que se referem os canhotos de fls. 87/88, e diante da omissão de Jairo Cassiano em demonstrar que não foram utilizados em benefício de sua campanha eleitoral, tenho que eles, tal como o cheque de fl. 12, tiveram a destinação indicada na petição inicial.” (fl. 85).
Em exame perfunctório, não vislumbro a explícita finalidade eleitoral de tais cheques, tampouco a potencialidade lesiva neste caso.
No que toca ao cheque emitido no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), que teria se destinado à garantia de contrato de aluguel, no próprio decisum regional anota-se que o documento era desprovido das formalidades previstas no Regimento Interno da Câmara de Vereadores, pelo que não teria serventia. Some-se a isso, o fato de o cheque não ter sido utilizado, pois foi sustado.
Assim, há fundadas dúvidas quanto à configuração do ilícito eleitoral.
A existência de potencialidade, neste caso, também é discutível e merece melhor análise por esta c. Corte, já que, em princípio, não vejo como a prática desta conduta isolada influenciaria na vontade do voto popular ou no tratamento isonômico (”equilíbrio na disputa” ) entre os candidatos - legitimidade das eleições.
As alegações dos autores, pois, são plausíveis. O perigo da demora é evidente, ante a possibilidade de realização de novas eleições em breve.
Ressalto que dada a complexidade do caso concreto, na linha dos precedentes desta c. Corte, ¿(…) deve ser evitada a indesejada sucessão de mandatários no comando do Município, salvo por decisão judicial com esse efeito” (MS nº 3.654/BA, Rel. Min. José Delgado, DJ de 7.4.2008).
Com essas considerações, considerando que o posto de Chefe do Executivo é atualmente ocupado pelo Presidente da Câmara Municipal, defiro o pedido liminar para suspender a realização de eleição suplementar até o julgamento dos recursos especiais eleitorais (art. 36, § 7º, RI-TSE).
Comunique-se, com urgência, o e. TRE/AC.
Publique-se. Intimações necessárias.
Brasília, 9 de novembro de 2009.
MINISTRO FELIX FISCHER
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